Era mais ou menos 19:00 horas, quando um novo morador no prédio chamado Moriá chegou, na rua Esperança n. 5 no bairro México. Ele, pelo visto, terminava de cumprir o seu período no exército. Pois, deste dia que o conheci, nunca mais o vi vestido com a farda.
Branco, olhos verdes, cabelo loiro, eloqüente, aparentava ser bom moço.
No início, não falava muito, mas com tempo revelou-se um grande contador de estórias.
Entendi que vinha pra ficar, que vinha de vez para morar com a Sra kail, sua mãe que vivia sozinha no terceiro andar deste mesmo prédio que eu vivia.
Naquele dia, falamos pouco, mas nos dias seguintes, passamos a conversar com muito freqüência.
E foi ai que tudo começou. Sua história no prédio Moriá, no bairro México.
O resto, ele mesmo encarregou-se de fazer sozinho. Ele enturmou-se muito mais do que qualquer outro rapaz. Porque era carismático, a ponto de ganhar o carinho dos meninos e meninas que moravam ali.
No bairro que morávamos, havia um clube chamado Recreativo Campestre, onde ocorria shows com artistas famosos: E como o ser humano é um ser social, Lallevi tinha que marcar a sua presença neste clube também, isto é, em cada evento que ocorria neste local.
A medida que surgia eventos, passou a ser notado que lallevi entrava numa briga, em outra, noutra e assim por diante. A tal ponto que sua fama foi crescendo em nível de bairro , interbairro e municipal.
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Agora aquele rapaz que parecia ser tão manso, tinha repercussão muita grande numa cidade. E a notícia que sempre surgia no bairro do México, depois dos términos dos eventos era: “ Lallevi quase morreu!”. No evento do baile do Havaí, beltrano ia apertar o gatilho, no instante que Lallevi abriu a sua camisa e disse : “Se você é homem atire!” E nada aconteceu porque a arma 765 falhou.
Outra notícia que, ora vez circulava também era a de que Lallevi derrubou três com seus golpes de rabo de arraia e voadoras. E isto sempre com doses e doses de vinho na cabeça, misturado com cervejas. Foi através dele que ouvi pela primeira vez a palavra Engove, dizendo:
- Todas as vezes que você for beber, tome um comprimido de Engove para não ter ressaca no dia seguinte.
Lallevi com toda esta fama de mal, ficou marcado em minha memória como um grande amigo, pelos seguintes motivos:
Um, foi porque morávamos no mesmo prédio e ali eu sempre o encontrava.
Outro motivo, foi porque no dia da minha primeira comunhão na igreja católica, minha mãe havia pego dois ônibus para aconselhar-me a não tomar a aquela atitude de ser um católico, explicando-me princípios bíblicos que eu até então não entendia. Pois bem, minha mãe, naquele dia, não havia tido êxito comigo e havia ido embora para Vila Astúria, um bairro distante do meu e assim destinei-me para a igreja para cumprir com aquele sacramento. Foi exatamente neste momento que aconteceu a tragédia, Lallevi entrou pelo acesso que levava ao teto do prédio e com cobertor desceu até o seu andar para entrar pela varanda no apartamento que era o da sua mãe e onde morava com ela para retirar de lá sei lá o quê, no entanto, não sei se na descida ou na subida o cobertor arrebentou e lá foi Lallevi para o chão. Do terceiro andar, sofreu uma queda violenta. Mas que por sua sorte, meu pai que trabalhava como motorista de ambulância do hospital Santa Lucinda, um dos maiores hospitais de Sorocaba acabava de chegar na rua de nosso prédio e não teve tempo de descansar por um minuto e teve que retornar, colocando o Lallevi sobre a maca e dentro da ambulância para transporta-lo para o hospital para ser socorrido. Assim, ele tinha uma espécie de gratidão pelo meu pai que conseqüentemente fazia eu ser beneficiado com isto.
Outro motivo, foi ...não sei por qual cargas d´água tentou se matar e cortou a veia aorta e mais uma vez meu pai estava lá para socorrê-lo.. A noticia correu desta forma: de madrugada, sua mãe a Sr kail bateu na porta do apartamento do meu pai desesperada e não sei como, meu pai ajudou-lhe ser socorrido e deu certo, safava-se da morte milagrosamente mais uma vez. Nesta hora eu estava dormindo e não vi nada.
E outro motivo e crucial para a nossa sincera amizade, foi que devido ao montante de brigas e encrencas envolvidas, ficou mais sujo do que pau em galinheiro com a polícia
que ficou impossibilitado de sair de sua casa por dois anos e ganhou uma Sursis (Se o juiz define o prazo de dois anos para o sursis, o condenado ficará durante esse período em observação. Se não praticar nova infração penal e cumprir as determinações impostas pelo juiz, este, ao final do período de prova, determinará o fim da pena. Se durante o período de prova houver revogação do sursis, o condenado cumprirá a pena que se achava com a execução suspensa.)
Então, este momentos foram os momentos mais legais da minha vida de adolescente pela companhia que me proporciou, dois anos no prédio Moriá.
Ele não saia do prédio para nada. Eu porque meu pai não deixava sair mesmo
e o Lallevi por obrigação imposta pela justiça.
Então, alguma coisa tinha que ser feito! Não se podia ficar trancado e ter que suportar a enfado, o tédio de uma rotina monótona diária, por este motivo, tínhamos que inovar. Foi aí que Lallevi começou a ficar no térreo do prédio todos os dias e eu também. No início ficávamos conversando. Ele ficava contando piada, contando estórias, fofocando, falando bem e mal dos outros por horas e horas a fio, com graça e alegria, que não enjoava, falávamos de tudo. Não havia assunto que chegasse para matar o tempo.
Mas a maior idéia veio, quando criamos as partidas de truco.
É um jogo de quatro pessoas e que é de dois contra dois . Onde cada um recebe três cartas e uma carta é virada na mesa. Se virar a carta número 1 que é o as então o 2 é o coringa e assim sucessivamente.
No entanto os naipes são importantes.
Naipes de ouro, copas, paus e espadas. O menor entre os naipes é o de espada e depois o maior do que o de espada é o naipe de ouro , depois o maior do que o naipe de ouro é o de copas e o naipe maior do que o de copas e que é o sumo dos naipes é o naipe de paus.
E o segredo deste jogo é o blefe e o desafio que surge entre as duas duplas.
Ocorre o seguinte, um jogador que pensa ter uma ótima carta na mão ou pode estar blefando grita “truco” e assim os outros replicam blefando ou falando a verdade retrucando 3 o adversário 6 e outro 9 até chegar no máximo que é 12.
Vira uma gritaria só.
Imagine isso num condomínio de cohab.
No início era eu e ele.
Mas nos dias seguintes virou sucesso.
A garotada do bairro vinha para jogar, as vezes tinha umas seis duplas a dez esperando para chegar a sua vez. Quer dizer os outros moradores do prédio não gostavam nadinha desta idéia.
Dois anos passaram e agente não viu.
Lallevi começou a trabalhar, mudou de vida, casou e se tornou o melhor exemplo para uma comunidade.
Jorge kaalebe